A panela da nova cultura
Na grande panela da nova cultura se encontra de tudo. O cultural se torna político-social-cultural e as pessoas vivenciam uma crise de valores, na cultura do circo, festiva e carnavalesca
A palavra cultura (em sentido amplo) recobre um conjunto de interpretações do mundo e, sobretudo, de padrões de comportamento. As pessoas necessitam de orientações em seus cotidianos para posicionar-se, decidir e atuar num mundo complexo e aleatório. Mas se a religião e a cultura entram em aliança, a independência da pessoa queda-se quase ilusória e a emancipação pessoal requer um esforço formidável do qual muito poucos são capazes. Em sentido restrito, a cultura de uma época são suas formas de linguagem, sua música, sua arte, seu saber literário, enfim,o que sempre se entendeu por cultura direta (in recto).
Segundo Blas Lara (2010), a cultura contemporânea “se converteu num ectoplasma, numa doxa coletiva, num estado de opinião, numa sensibilidade”. Na grande panela dessa nova cultura se encontra de tudo: uma boa dose de relativismno nietzscheano (para eliminar o gosto rançoso dos valores tradicionais); relativismo moral não obscuro e nihilista, mas aliviado pela frivolidade e a mudança; mais diversão; mais ecoturismo; um bouquet de dogmas políticos; uma dose de ingênua bondade política interna e externa e, por último, novos e simplistas credos democráticos. Toda essa mistura é remexida e agitada por alguns meios de comunicação televisivos e radiofônicos, e servida diariamente..
Lara (2011) observa que “o cultural”, em sua versão de contrabando, “se converte em político-sócio-cultural”, ensejando um conceito de “nova cultura”. Vendem-se como cultura um cinema que de nenhuma maneira reflete a realidade social local, o disparate inconsequente de muitos programas de televisão e uma banalidade sem limites na linguagem, tanto na mídia como na rua, em permanente competição para saber quem é mais grosseiro. “Este será o mais engraçado e o mais inteligente”, para as crianças em idade escolar.
A sociedade contemporânea (quase toda) está aflita com o desemprego e a crise econômica endêmica, mas outra crise pode afligí-la, mais duramente, em profundidade: “a crise dos valores que mina os fundamentos de nossa vida em comum, a família e o Estado” e que deveria estar no centro do debate social e, não, o cataplasma universal da nova cultura (Lara, 2010).
Pão e circo eram no tempo dos romanos. Hoje basta ao povo apenas a cultura do circo, festiva e carnavalesca, como a dos dias de orgulho gay – versão amistosa das grandes paradas nazi-fascistas – ou como a montagem midiática dos multititudinários fervores em honra de heróis desportivos, que também já foi usado, em outros tempos, como ópio do povo, e hoje ainda servem para alienar as massas (Lara, 2010).Os políticos inventam sentido para as coisas e, segundo Lara (2010) esse sentido passa a ser o cerne de uma propaganda destinada a comprar adesões – uma propaganda adulterando a realidade para suavizar perfis audaciosamente danosos e dolorosos por meio de um slogan ilusório, que assim se reume: Aqui tudo vai bem e viva a festa, porque podemos pagar!
Nesse labor, os forjadores de doxas coletivas se apoderaram da linguagem através da imprensa e das televisões, que são artífices permanentes da opinião pública, e falsificam o sentido das palavras. Uma delas é a palavra democracia, usada maliciosamente como conceito-chave nas sociedades ocidentais contenporâneas.
[...] aí temos a obra de mercenários da ideologia redefinindo o que é democrático e o que não é. Uma apropriação semântica vergonhosa. Para dar um exemplo concreto: tem que vem ver com que furor taxam de antidemocrático quem quer debater sobre a oportunidade das mencionadas gays parade,que apesar de ser objeto de riso universal, deveriam ser um sério tema de debate (Lara, 2010).A nova cultura se reveste de formas religiosas, com seu alto e baixo clero e fervorosos apóstolos que tergiversam tudo, inventando falsos focos de interesse para as pessoas do povo, levando-as ser esplendidamente dadivosas com as misérias distantes e pouco conscientes da magnitude da própria situação. +►►